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DISCURSO SOBRE A MORTE

Alguns temas causam certo constrangimento, e as pessoas evitam tocar no assunto ficando chocadas quando alguém ousa fazê-lo. O suicídio, acredito, é um deles.

Como eu gosto de olhar além e expor o que penso nunca foi um problema para mim, resolvi escrever sobre a morte, com foco no ato de tirar a própria vida.

 

Postei no meu mural do Facebook a seguinte frase:

“Às vezes acho que era melhor bater a cabeça, cair e ir dessa para o além… affff…”

 

Não precisei esperar muito para começar a receber alguns comentários e mensagens privadas. É impressionante como o “trágico” atrai as pessoas. Apesar de muitos repudiarem o que eu escrevi, houve interação, interesse, vontade de saber o que estava acontecendo. Independentemente da razão — preocupação, curiosidade, gerar papo para uma fofoca — o assunto cria esse desejo pelo “saber o motivo”.

 

O que leva uma pessoa a pensar no suicídio e cometê-lo? Talvez uma ausência profunda de sentimentos positivos; talvez o medo de enfrentar um grande problema ou doença; talvez o cansaço de tentar, tentar e tentar, e nada conquistar; talvez essa seja apenas parte de sua história e teria de ter esse fim. E não há “pecado” algum em tirar a própria vida. Talvez…

 

Voltando ao post do Facebook, fiquei imaginando o que passou na cabeça de cada um que o leu. Tenho certeza de que muitos viram e, apesar de não comentarem, gerou um ti-ti-ti: “Você viu o que a Marcela postou? Que horroooorrrr” etc. e tal. Apenas dois comentários denotavam sátira. E, sinceramente, foram os que mais gostei. Bacana quando alguém lê algo “pesado”, como a frase que eu escrevi, e não se importa de fazer uma piada, um comentário divertido. Isso mostra a transparência da pessoa — ela escreveu exatamente o que pensa, sem medo de ser tachada por nossa sociedade tão hipócrita.

 

A impressão que tenho é que existe uma redoma que coloca a vida em uma posição magnânima e, consequentemente, condena aqueles que tiram a própria vida. Para quem acredita em Deus, é dele a opção de dar e tirar a vida que a nós pertence. Opa! Então, não nos pertence, uma vez que não temos o direito sobre ela, apenas usufruímos por um tempo pré-determinado por deuses, pelos orixás, extraterrestres… Dependerá da crença de cada um.

 

Fica fácil passar esse fardo para um ser onipresente. Vejo como puro comodismo, medo de se expor, culpa (“o que vão pensar de mim?”: essa é a campeã). A verdade é que fomos criados dessa forma, com essa culpa e medo dentro de nós. E a polêmica é velha! Na Idade Média, por exemplo, o [1] suicídio era visto como um pecado imperdoável. Passados milhares de anos, o assunto ainda gera desconforto e é condenado da mesma forma…

 

O primeiro suicida, segundo pesquisa na internet, foi [2] Periandro (século VI a.C.), um dos Sete Sábios gregos. O motivo: evitar que seus inimigos esquartejassem seu corpo depois de morto. Veja bem, ele já estava com os dias contados, mas preferiu tirar a própria vida a ter seu corpo mutilado. Fazendo aqui um trocadilho mórbido, a expressão “beleza grega” faz todo sentido.

 

Depois do primeiro, a fila andou e, segundo estudo da [3] OMS publicado em março de 2025, 727 mil pessoas tiram a própria vida todos os anos. Isso equivale a 1 morte a cada 40 segundos. O suicídio é a terceira principal causa de morte entre jovens de 15 a 29 anos, e cerca de 73% dos casos ocorrem em países de baixa e média renda. No Brasil, o número de suicídios também é alarmante. De acordo com o [4] 19º Anuário Brasileiro de Segurança Pública (2025), foram registrados 16.679 suicídios em 2024, um aumento em relação aos 16.262 casos de 2022. Isso representa uma média de 45 suicídios por dia. É muita gente cometendo o tal pecado imperdoável. O “inferno” deve estar com superlotação.

 

A vida e a morte são um grande mistério. A única certeza que temos sobre a vida é que a morte chegará — e com ela, um fim ou recomeço na nossa história. Vai depender da crença de cada um ou da falta dela.

 

Para fechar esse discurso, deixo aqui minha opinião sobre vida e suicídio. Eu acredito que somos fantoches da nossa própria história. Livre-arbítrio não existe. Eu viverei o que tiver de viver, o que está escrito para mim. Se eu vou morrer aos 95 anos dançando, ou tocando saxofone (que eu adoro), ou fazendo um sexo animal com meu velhinho, ou vou atirar-me de um penhasco e tirar minha própria vida, assim eu o farei. Suicídio, para mim, não é pecado, não é nada pavoroso, imperdoável — é apenas parte da história de vida.

 

Agora, quem está no comando das cordas do meu fantoche é tema para outro discurso. Quem sabe, breve.

Referências:

[1] UOL

http://filosofia.uol.com.br/filosofia/ideologia-sabedoria/31/artigo228115-2.asp

[2] Metamorfose Digital

http://www.mdig.com.br/index.php?itemid=7046#ixzz3bWwueiVG

[3] Organização Mundial da Saúde

https://www.who.int/news-room/fact-sheets/detail/suicide/

[4] 19º Anuário Brasileiro de Segurança Pública: 2025

https://publicacoes.forumseguranca.org.br/items/c3605778-37b3-4ad6-8239-94e4cb236444

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